“Crooked House” é daquelas histórias que diz muito à autora, com fortes ligações ao Egipto e tendo lugar num ambiente bastante isolado da sociedade. É protagonizada por Charles Hayward, um ex-espião tornado investigador que tem boas ligações à Scotland Yard. Uma velha amiga chama-o a resolver a morte mais mediática da época, a de Aristide Leonides. A Yard quer resolver o caso, mas não se importa que seja alguém externo para não causar um escândalo ao anunciar que a polícia suspeita de crime. Só que para Hayward este caso não é simples. Sophie foi sua namorada e é uma das herdeiras. Estará apto para separar o coração da razão e tomar toda a família como suspeitos por igual?
Esta adaptação para cinema vem obviamente embalada no mediatismo do blockbuster que é Orient Express. Christie não está esquecida, mas poucas obras além de Poirot e Miss Marple conseguiram sucesso nos formatos além do papel. Esta era a altura de despachar todos os direitos cinematográficos que estivessem pendentes. O elenco reunido foi de luxo. Max Irons e Stefanie Martini podem não bastar para atrair as multidões, mas quando são secundados por Glenn Close, Christina Hendricks, Gillian Anderson e Terence Stamp, já se assemelha a uma grande produção. Na realização está Gilles Paquet-Brenner, um francês acostumado a trabalhar na fronteira entre os dois continentes que utiliza várias estrelas internacionais em produções de cariz europeu. É isso que temos aqui. Uma história britânica. Um realizador francês. Um elenco que inconscientemente sabemos vir de todo o mundo ainda que não transpareça. Uma amálgama de culturas num filme de época.
Concentrar a acção na casa senhorial teria sido mais adequado a obra em questão. As idas frequentes de Hayward a Londres quebram o ambiente de intriga conseguido no seio da família Leonides. As poucas pistas que vão chegando de fora são importantes para fortalecer a personagem, mas empobrecem a narrativa. Quando é revelado o perpetrador, a indiferença ganha e a única sequência com alguma acção parece fora de contexto. Aquelas personagens eram suficientemente incríveis para não precisarem de distracções. Os Leonides vão falando um a um e lançando suspeitas sobre eles mesmos e sobre os outros de forma cruel. Nenhuma personagem ganha destaque, e por isso são todos vultos suspeitos.
Charles é demasiado sensaborão para levar o filme sozinho. Sophia é o tempero com uma performance de Stefanie Martini no ponto. Não demasiado tempo para se evidenciar da família. Não de menos para se tornar irrelevante. Quando estes dois estão juntos a trama adensa-se. Em separado o filme não cativa. Em parte isso é causado pela chama latente só que os flashbacks de Charles e Sophia numa época mais simples também não ajudam em nada o filme. É outra das saídas da mansão que eram desnecessárias.
A substância está lá - na música, nos cenários - mas diluída em demasiados extras na escrita. A adaptação não é completamente fiel ao livro nem suficientemente arriscada para justificar as mudanças. O livro tinha bastantes mais twists e ainda que alguns tivessem perdido o sentido, não podia ter sido tão linear. Sai-se com a sensação de ter sido um bom filme, mas que se esquece depressa.